quarta-feira, 20 de novembro de 2019

O mal-estar da contemporaneidade: os efeitos da nostalgia e da desorganização temporal.




Nostalgia | s.f.
(Francês nostalgie, do grego nóstos, -ou, regresso a casa, viagem + grego álgos, -ous, dor)
Substantivo feminino
1. Tristeza profunda causada por saudades do afastamento da pátria ou da terra natal.
2. Estado melancólico causado pela falta de algo ou de alguém. ”

Temporalidade, aceleração, realidades. Conceitos indispensáveis para o estudo de todas as questões que permeiam o campo da História e da Teoria. Concepções que dizem respeito sobre quem somos, o que somos e onde estamos. Nessa relação entre memória, identidade e tempo, a nostalgia aparece como um sintoma contemporâneo, caracterizando-se não apenas como uma emoção histórica, mas também como uma “tristeza profunda causada por um afastamento” ou um “estado melancólico causado pela falta”.
Svetlana Boym, em seu texto, “Mal-estar da Nostalgia”, propõe uma reformulação do conceito de Nostalgia, que se diferencia intrigantemente da definição proposta pelo dicionário, além de propor também uma relação de tal abstração com a política.
Durante o século XVII e XIX, a nostalgia era tida como uma doença de cunho patológico e, por esse motivo, nunca foi vista como uma doença histórica e crônica. Nesse sentido, tal percepção ganha espaço a partir do processo de aceleração, ganhando, por consequência, uma nova definição.
A modernidade, por mais que se constituísse em um movimento que caminhasse linearmente para o progresso e para o futuro, sempre foi acompanhada também de diferentes opiniões e críticas, pelos sentimentos difusos que são indissolúveis à modernidade. A nostalgia, então, torna-se um desses anseios modernos, uma pretensão por um tempo diferente.
Dessa forma, adquire a definição de um sentimento de perda e de deslocamento, de um certo tipo de fascínio com uma fantasia que é criada individualmente e coletivamente, estabelecendo uma relação direta com a memória e com a temporalidade em que está inserida. De certa maneira, a nostalgia também é uma forma de contraposição à aceleração, uma vez que, a partir dela, busca-se a aproximação com um tempo em que as coisas eram mais lentas ou ainda, se constituíam com uma genuinidade intocável.
Contemporaneamente, a nostalgia conta ainda com a adição de uma artificialidade, produzida sobretudo, com o advento da internet e da tecnologia. A todo momento, cria-se uma simulação que tem como consequência a alteração da realidade, de um aumento do imaginário e que evidencia uma certa “disneyficação”, bem como propõe Andreas Huyssen, colocada pelo autor como forma de entretenimento, como um processo inserido dentro da lógica do capitalismo e mais perigoso que isso, associadas à política como forma de viabilização de formas de governo, muitas vezes autoritárias. As crises dos governos na América Latina compõem a série de exemplos contemporâneos e a retomada de uma nostalgia política, alude a situação do Brasil, feita principalmente, a partir do recalque e da volta de memórias a respeito do período ditatorial.
A todo momento, esses acontecimentos evidenciam certa desorganização temporal e, acrescidos do papel das mídias, o passado, principalmente, é transformado pela indústria, fazendo refletir um certo medo de uma saudade e de um tempo anterior ao nosso, e que ao passar por todos esses processos, é alterado de modo a mudar sua própria veracidade, produzindo consequências no futuro.

Ao entender todos esses processos, torna-se necessário entender também as formas de lembranças, as formas de esquecimentos, os meios de negação e silenciamento, os recalques trazidos pelo trauma e ainda, os movimentos em direção ao passado e também ao futuro. É compreender a ambivalência existente entre o pertencimento, a saudade e as contradições da própria modernidade. 

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