quinta-feira, 28 de novembro de 2019

A pretensão não antropocêntrica






Em seu artigo “Para além do antropocentrismo nos estudos históricos” Ewa Domanska nos convida a pensar na possibilidade de construção de uma história não-antropocêntrica. Ao longo do texto, a autora desenvolverá a hipótese que o desafio às pesquisas de hoje não está na elaboração de novas questões ou teorias, mas sim no deslocamento da própria investigação para uma forma de conhecimento não antropocêntrico. Entretanto, a pergunta que se coloca é a seguinte: será possível, por meio da nossa linguagem, construir uma narrativa que não seja antropocêntrica, ou o próprio ato linguístico de narrar é por si só antropocêntrico?
Essa questão coloca para nós uma reflexão sobre a própria linguagem, de modo a questionar até que ponto essa linguagem humana dá conta de incluir na narrativa esses elementos outros que fazem parte de campos linguísticos totalmente distintos, principalmente no que tange a linguagem humana acadêmico-científica. Assim, quando tentamos buscar mesclar elementos de uma história natural, ou de uma história das espécies, com a história dita humana, talvez não consigamos ir muito além do que de uma “humanização” das outras formas de ser e estar no mundo. Aqui, não digo necessariamente uma humanização no sentido de transposição literal de normas e valores, mas porque o próprio ato de narrar já é por si só humano.
Com isso, não necessariamente criamos uma forma de narrativa não antropocêntrica, mas apenas conseguimos colocar, no seio dessas narrativas, elementos outros ditos “naturais”, mas ainda sobre um filtro e uma ótica de interpretação humana. Então talvez o primeiro passo seja perceber que não conseguimos fugir totalmente de uma narrativa que não seja, em alguns pontos, antropocêntrica, mas que podemos buscar alargar os horizontes que essas narrativas abarcam. Compreender então que a narrativa histórica e a nossa linguagem são por si só elementos humanos, talvez seja o passo inicial mais significativo que possamos dar em relação a essa tentativa de escapar, ou de ao menos diminuir os efeitos, do nosso próprio antropocentrismo.

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