terça-feira, 3 de dezembro de 2019

Irreversibilidade, tempo histórico X tempo da justiça e trauma



“Pensar sobre as vítimas da injustiça histórica com seriedade” é um dos pontos centrais do livro de Berber Bevernage, além da proposição de repensar o tempo histórico e sua irreversibilidade. Compreender o papel do discurso histórico na mediação dos passados violentos e autoritários perpetrados pelo Estado e o sentido e “alcance ético” das comissões de justiça, como a própria Comissão da Verdade brasileira, são temas latentes dentro do período de instabilidade institucional e retomada de memórias da Ditadura Civil-Militar que experimentamos. 
Bevernage coloca que a própria noção de tempo histórico que normalmente utilizamos no trabalho como historiador é mais coerente com a dos torturadores do que com a dos torturados. Abordar um passado como irreversível e irrevogável vai de acordo com a ideia de que os processos temporais acontecidos simplesmente aconteceram, e nada pode ser feito. Uma das proposições centrais do texto se liga justamente à diferenciação do tempo histórico de um “tempo da justiça”. Uma contraposição entre o afastamento do passado como forma de resolução de demandas e da luta pelo reconhecimento da permanência do mesmo, da existência do trauma nos sujeitos afetados e da necessidade de cancelamento do efeito nocivo através do cumprimento de uma pena.
Desta forma, a história modernista seria uma instrumentação utilizada para o esquecimento de eventos que não podem ser esquecidos, enquanto traumas permanecem mais reavivados com a exaltação de torturadores por chefes de Estado com tendências autoritárias.  Compreender a talvez indistinta separação entre passado e presente para exercer uma política de reparação que de fato funcione é essencial, assim como a escuta dos sujeitos que passaram pelo trauma e a ampliação de suas vozes não somente como vítimas, mas como corpus documentais da própria história. 
  
Referências

BEVERNAGE, Berber. História, Memória e Violência de Estado: Tempo e Justiça. Editora Milfontes. Espírito Santo, 2018. 

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